VALÉRIA CRISTIANE VALIDÓRIO
INVESTIGANDO O USO DE MARCADORES CULTURAIS
PRESENTES EM QUATRO OBRAS AMADEANAS,
TRADUZIDAS PARA O INGLÊS
Tese apresentada ao Instituto de Biociências, Letras e
Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista,
Câmpus de São José do Rio Preto, para obtenção do título
de Doutor em Estudos Lingüísticos (Área de
Concentração: Lingüística Aplicada)
Orientador: Profa. Dra. Diva Cardoso de Camargo
São José do Rio Preto
2008
Validório, Valéria Cristiane.
Investigando o uso de marcadores culturais presente em quatro obras
amadeanas traduzidas para o inglês / Valéria Cristiane Validório. - São
José do Rio Preto : [s.n.], 2008.
306 f.; 30 cm.
Orientador: Diva Cardoso de Camargo
TESE (DOUTORADO) - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA, INSTITUTO
DE BIOCIÊNCIAS, LETRAS E CIÊNCIAS EXATAS
1. Tradução e interpretação. 2. Lingüística de corpus. 3. Tradução
cultural. I. Camargo, Diva Cardoso de. II. Universidade Estadual
Paulista, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas. III. Título.
CDU - 81’255
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IBILCE
Campus de São José do Rio Preto - UNESP
COMISSÃO JULGADORA
Titulares
Profª. Drª. Diva Cardoso de Camargo - Orientadora
Prof. Dr. Francis Henrik Aubert
Profª. Drª. Heloisa Gonçalves Barbosa
Prof. Dr. Antonio Manoel dos Santos Silva
Prof. Dr. Peter James Harris
Suplentes
Prof. Dr. John Milton
Profª. Drª. Ofir Bergemann de Aguiar
Prof. Dr. Nelson Luís Ramos
AGRADECIMENTOS
À minha família, pelo constante apoio e por ajudarem a realizar meus sonhos.
À minha orientadora Profª Drª Diva Cardoso de Camargo, pela competente orientação,
pela confiança e amizade durante todos esses anos.
À FAPESP — Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, financiadora
de minha pesquisa, pelas bolsas de mestrado e doutorado direto.
Ao Prof. Dr. Francis Henrik Aubert, da USP, à Profª Drª Heloisa Gonçalves Barbosa, da
UFRJ, Prof. Dr. Antonio Manoel dos Santos Silva, da UNESP, e ao Prof. Dr. Peter
James Harris, da UNESP, pela participação na banca de defesa e pelas valiosas
contribuições para a pesquisa.
À Profª Drª Célia Maria Magalhães, da UFMG e à Profª Draª Claudia Maria Xatara, da
UNESP, pela participação na banca do Exame Geral de Qualificação e pelas
importantes contribuições para a pesquisa.
Aos membros da equipe PETra, pela amizade e ambiente agradável ao trabalho.
Aos funcionários da Seção de Pós-Graduação deste Instituto, por todos os serviços
eficientemente prestados.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................ 11
OBJETIVOS.............................................................................................................. 15
Objetivos Gerais....................................................................................................... 15
Objetivos Específicos............................................................................................... 16
1. JORGE AMADO: OBRA E DADOS BIBLIOGRÁFICOS................................. 21
1.1. A VIDA DE JORGE AMADO............................................................................ 24
1.2. A OBRA DE JORGE AMADO........................................................................... 28
1.3. OBRAS SELECIONADAS PARA NOSSA PESQUISA.................................... 30
1.3.1. MAR MORTO................................................................................................... 30
1.3.2. O SUMIÇO DA SANTA................................................................................... 32
1.3.3. TENDA DOS MILAGRES............................................................................... 33
1.3.4. TIETA DO AGRESTE...................................................................................... 35
2. ASPECTOS CULTURAIS NA TRADUÇÃO........................................................ 39
2.1. A TRADUÇÃO CULTURAL............................................................................. 39
2.2. O TRADUTOR LITERÁRIO E A TRADUÇÃO CULTURAL......................... 42
2.3. A TRADUÇÃO LITERÁRIA: DIFUSORA DE CULTURAS.......................... 46
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA........................................................................... 48
3.1. CONCEITUAÇÃO DE MARCADORES CULTURAIS NO ÂMBITO
DA PESQUISA................................................................................................... 48
3.2. CONCEITUAÇÃO DE CORPUS E CORPUS PARALELO NO
ÂMBITO DA PESQUISA...................................................................................
51
3.3.VERTENTE DOS ESTUDOS DA TRADUÇÃO BASEADOS
EM CORPUS............................................................................................. 53
3.3.1. Emprego dos corpora nos Estudos da Tradução....................................... 57
3.3.2. Algumas Ferramentas para Tratamento de Corpora................................. 63
3.4. ASPECTOS DE TRADUÇÃO INVESTIGADOS POR BAKER...................... 65
3.5. CONCEITUAÇÃO DE DOMÍNIOS CULTURAIS NO
ÂMBITO DA PESQUISA................................................................................. 68
3.6. CONCEITUAÇÃO DE MODALIDADES TRADUTÓRIAS NO
ÂMBITO DA PESQUISA................................................................................... 69
4. MATERIAL E METODOLOGIA.......................................................................... 80
5. ANÁLISE DE RESULTADOS................................................................................ 86
5.1. ANÁLISE DA TRADUÇÃO DE MARCADORES CULTURAIS
E SEUS COLOCADOS...................................................................................... 86
5.1.1. ANÁLISE DA TRADUÇÃO DE MARCADORES CULTURAIS E
SEUS COLOCADOS NAS OBRAS MAR MORTO/SEA OF DEATH
E O SUMIÇO DA SANTA/THE WAR OF THE SAINTS, POR
GREGORY RABASSA…....................................................................... 88
5.1.1.1. Análise do Marcador Cultural ‘SAVEIRO’ em Ambos
os Textos Originais............................................................................. 89
5.1.1.1.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o marcador cultural 'SAVEIRO', na
obra Mar Morto...................................................................... 90
5.1.1.1.2. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o marcador cultural ‘SAVEIRO’, na
obra O Sumiço da Santa......................................................... 93
5.1.1.2. Análise do Marcador Cultural ‘SAVEIROS’ em ambos os Textos
Originais................................................................................................ 95
5.1.1.2.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o marcador cultural 'SAVEIROS', na
obra Mar Morto...................................................................... 96
5.1.1.3. Análise do Marcador Cultural ‘IEMANJÁ’/‘YEMANJÁ’ em ambos
os Textos originais................................................................................. 97
5.1.1.3.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o marcador cultural ‘IEMANJÁ’ na obra
Mar Morto................................................................................. 99
5.1.1.4. Análise do Marcador Cultural ‘CACHAÇA’ em ambos os Textos
Originais................................................................................................100
5.1.1.4.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o Marcador Cultural ‘CACHAÇA’, na
obra Mar Morto........................................................................ 102
5.1.1.5. Análise do Marcador Cultural ‘MULATA’ em ambos os Textos
Originais............................................................................................ 103
5.1.1.5.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o marcador cultural ‘MULATA’ na
obra Mar Morto....................................................................... 104
5.1.1.6. Análise do Marcador Cultural ‘TERREIRO’ em ambos os Textos
Originais.................................................................................................. 104
5.1.1.6.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o Marcador Cultural ‘TERREIRO, na
obra Mar Morto........................................................................ 106
5.1.1.6.2. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o Marcador Cultural ‘TERREIRO, na
obra O Sumiço da Santa........................................................... 106
5.1.2. ANÁLISE DA TRADUÇÃO DE MARCADORES CULTURAIS
E SEUS COLOCADOS NAS OBRAS TENDA DOS MILAGRES/
TENT OF MIRACLES E TIETA DO AGRESTE/TIETA (THE
AMERICAS), POR BARBARA SHELBY MERELLO.......................... 107
5.1.2.1. Análise do Marcador Cultural ‘SAVEIRO’ em Ambos
os Textos Originais..................................................................... 108
5.1.2.2. Análise do Marcador Cultural ‘SAVEIROS’ em Ambos
os Textos Originais................................................................... 110
5.1.2.3. Análise do Marcador Cultural ‘IEMANJÁ/YEMANJÁ’
em Ambos os Textos Originais.................................................. 111
5.1.2.4. Análise do Marcador Cultural ‘CACHAÇA’ em Ambos
os Textos Originais.................................................................... 113
5.1.2.4.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o Marcador Cultural ‘CACHAÇA’, na
obra Tenda dos Milagres.................................................. 117
5.1.2.4.2. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em
ocorrência com o Marcador Cultural ‘CACHAÇA’, na
obra Tieta do Agreste................................................................ 119
5.1.2.5. Análise do Marcador Cultural ‘MULATA’ em Ambos
os Textos Originais..................................................................... 120
5.1.2.6. Análise do Marcador Cultural ‘TERREIRO’ em Ambos
os Textos Originais................................................................... 122
5.1.2.6.1. Colocados com freqüência igual ou maior que 2, em ocorrência
com o Marcador Cultural ‘TEREIRO’, na obra Tenda dos
Milagres................................................................................................... 125
5.2. ANÁLISE DO COMPORTAMENTO LI
NGÜÍSTICO-TRADUTÓRIO
DE GREGORY RABASSA E BARBARA SHELBY MERELLO
EM RELAÇÃO EM RELAÇÃO À TRADUÇÃO DE MARCADORES
CULTURAIS.................................................................................................... 127
5.3. ANÁLISE DE MARCADORES CULTURAIS POR DOMÍNIOS
CULTURAIS................................................................................................... 132
5.3.1. Análise de Marcadores Culturais por Domínios Culturais nas
Obras Mar Morto e O Sumiço da Santa..................................................... 132
5.3.2. Análise de Marcadores Culturais por Domínios Culturais nas
Obras Tenda dos Milagres e Tieta do Agreste........................................... 136
5.4. ANÁLISE DE TRAÇOS DE NORMALIZAÇÃO............................................ 142
5.4.1. Comprimento do Texto/Sentenças........................................................ 145
5.4.1.1. Verbos: Auxiliares, Modais e Locuções Verbais............................ 146
5.4.1.2. Explicitação.................................................................................... 154
5.4.1.3. Marcadores Discursivos ou "Disjunções"...................................... 158
5.4.2. Aspectos Relativos ao Emprego da Pontuação.................................... 161
5.4.3. Estruturas Sintaticamente Complexas: Reordenação de Elementos.... 167
5.4.4. Adições nos Textos Traduzidos........................................................... 172
5.4.5. Metáforas nas Traduções..................................................................... 174
5.4.6. Mudança da Modalidade de Linguagem não Culta para a Culta......... 180
5.4.7. Omissões nos Textos Traduzidos........................................................ 187
5.4.8. Outras Mudanças na Tradução............................................................ 192
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 195
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E BIBLIOGRAFIA
CONSULTADA.................................................................................................... 203
APÊNDICES............................................................................................................... 213
APÊNDICE 1. Amostra da lista de palavras-chave fornecida pela
KeyWords em relação à obra Mar Morto........................................ 214
APÊNDICE 2. Amostra da lista de palavras-chave fornecida pela
KeyWords em relação à obra O Sumiço da Santa............................... 215
APÊNDICE 3. Glossário dos Marcadores Culturais encontrados em
Mar Morto e as respectivas traduções em Sea of Death,
e sua classificação por domínios culturais....................................... 216
APÊNDICE 4. Glossário dos Marcadores Culturais encontrados em
O Sumiço da Santa e as respectivas traduções em
The War of the Saints, e sua classificação por domínios
culturais.......................................................................................... 222
APÊNDICE 5. Glossário dos Marcadores Culturais encontrados em
Tenda dos Milagres e as respectivas traduções em
Tent of Miracles, e sua classificação por domínios
culturais.......................................................................................... 240
APÊNDICE 6. Glossário dos Marcadores Culturais encontrados em
Tieta do Agreste as respectivas traduções em Tieta
(The Americas), e sua classificação por domínios
culturais.......................................................................................... 276
LISTA DE ABREVIATURAS
LC: Língua de Chegada
LP: Língua de Partida
MC: Marcador Cultural
MM: Mar Morto
SD: Sea of Death
SS: O Sumiço da Santa
TC: Texto de Chegada
TdA: Tieta do Agreste
TdM: Tenda dos Milagres
TO: Texto Original
ToM: Tent of Miracles
TP: Texto de Partida
TT: Texto Traduzido
TtA: Tieta (The Americas)
WS: The War of the Saints
VALIDÓRIO, Valéria Cristiane. INVESTIGANDO O USO DE MARCADORES
CULTURAIS PRESENTES EM QUATRO OBRAS AMADEANAS TRADUZIDAS PARA O
INGLÊS. Tese de Doutorado apresentada à Universidade Estadual Paulista – UNESP, câmpus
de São José do Rio Preto, 2008.
RESUMO
Com o propósito de analisar o comportamento lingüístico-tradutório de dois tradutores
profissionais diante das dificuldades impostas pelas barreiras culturais na tradução,
investigamos os quatro corpora paralelos de nossa pesquisa, compostos por duas obras
traduzidas por Gregory Rabassa, Sea of Death (1984) e The War of the Saints (1993), em
relação às respectivas obras originais Mar Morto (1936) e O Sumiço da Santa (1988), escritas
por Jorge Amado, bem como por duas obras traduzidas por Barbara Shelby Merello, Tent of
Miracles (1971) e Tieta (The Americas) (1979) em relação às obras originais Tenda dos
Milagres (1969) e Tieta do Agreste (1977), do mesmo autor. Os objetivos principais que
nortearam o presente trabalho foram: analisar a tradução de marcadores culturais, verificar o
comportamento lingüístico dos tradutores profissionais Gregory Rabassa e Barbara Shelby
Merello por meio da observação das opções por eles utilizadas nas traduções, bem como dos
traços de nor
malização presentes nas quatro obras traduzidas. Para tanto, apoiamo-nos na
abordagem
interdisciplinar proposta por Camargo (2005, 2007), adotando, para o levantamento
e processamento eletrônico de dados, o arcabouço teórico-metodológico dos estudos tradução
baseadas em corpus de Baker (1993, 1995, 1996, 2004), bem como os estudos sobre a
lingüística de corpus, propostos por Berber Sardinha (2000, 2004). Com relação à classificação
e análise dos dados levantados, adotamos os trabalhos sobre as modalidades tradutórias de
Aubert (1984, 1998), a proposta de Nida (1945) para os domínios culturais, reformulada por
Aubert (1981), bem como os estudos sobre normalização de Baker (1996) e Scott (1998). A
metodologia adotada requereu a utilização do programa WordSmith Tools e as ferramentas por
ele disponibilizadas, que nos proporcionaram os recursos necessários para o levantamento de
dados ao longo das obras, bem como para a observação e análise dos aspectos culturais e
textuais. No que diz respeito ao comportamento lingüístico-tradutório de Gregory Rabassa e
Barbara Shelby Merello, os resultados obtidos a partir dos corpora paralelos de nossa pesquisa
mostraram que os tradutores utilizaram recursos diferenciados em relação à tradução de
aspectos culturais peculiares bem como de segmentos textuais nas quatro obras analisadas, tais
como: 1. reelaboração da mensagem por meio de alterações nas estruturas dos sintagmas; 2.
utilização de empréstimos da língua de partida na língua de chegada; 3. uso de explicitação; 4.
uso de adaptações; 5. emprego de traduções literais; 6. uso de omissões, entre outras e, por
vezes, utilizaram diversos recursos tradutórios ao mesmo tempo. Podemos citar, como exemplo
de empréstimos utilizados nos textos traduzidos, alguns vocábulos tais como acarajés,
berimbaus, caipirinhas, pai-de-santo, tapioca, xaréu. Os resultados apontaram também para a
utilização de várias soluções de tradução para um mesmo vocábulo nos textos traduzidos, fator
que permite ao leitor da língua de chegada perceber os diversos aspectos que constituem
determinado vocábulo, considerando os fatores extralingüísticos aos quais se refere no universo
da cultura de partida como, por exemplo, “caboclo”: “backwoods”, “caboclo”, “caboclo
backwoodsman” e “half-breed”. Desse modo, pudemos observar dificuldades impostas pelas
barreiras culturais na tradução de vocábulos peculiares da cultura de partida, bem como
observar recursos utilizados de maneira consciente ou inconsciente pelos tradutores, ao lidar
com as fronteiras culturais entre os universos de partida e de chegada. A utilização dos recursos
disponibilizados pela lingüística de corpus contribui para a teoria e para a prática tradutórias,
proporcionando maior conscientização acerca do papel desempenhado pelos tradutores, dos
recursos por eles empregados, bem como das tendências apresentadas diante da tradução de
obras originais de cunho regionalista.
PALAVRAS-CHAVE: Estudos de tradução baseados em corpus. Tradução literária.
Marcadores culturais. Normalização.
VALIDÓRIO, Valéria Cristiane. ANALYZING CULTURAL MARKERS IN FOUR NOVELS
BY JORGE AMADO TRANSLATED INTO ENGLISH. PhD Dissertation presented to
Universidade Estadual Paulista — UNESP (University of the State of São Paulo), campus of
São José do Rio Preto, Brazil, 2008.
ABSTRACT
Intending to analyse the translational linguistic behavior of two professional translators faced
with difficulties imposed by cultural barriers in translation, we analyzed four parallel corpora in
our research, composed by two novels translated by Gregory Rabassa, Sea of Death (1984) and
The War of the Saints (1993), in comparison with the original novels Mar Morto (1936) and O
Sumiço da Santa (1988), written by Jorge Amado, as well as by two novels translated by
Barbara Shelby Merello, Tent of Miracles (1971) and Tieta (The Americas) (1979), in
comparison with the original novels Tenda dos Milagres (1969) and Tieta do Agreste (1977),
written by the same author. Our main objectives were: to analyze the translation of cultural
markers, to observe Gregory Rabassa’s and Barbara Shelby Merello’s professional behavior by
the analysis of resources used by them in their respective translations, and also to identify
normalization features in the four translated texts. With these purposes in mind, we based our
study on Camargo’s interdisciplinary proposal (2005, 2007) adopting, for the electronic
compilation and processing, the theory and methodology proposed by Baker for corpus-based
translation studies (1993, 1995, 1996, 2000), and the methodology adopted by Berber Sardinha
for corpus linguistics (1999, 2000, 2003, 2004). Concerning the classification and analyzes of
data gathered from our corpora, we based our study on the works on translation modalities by
Aubert (1984, 1998), on the works on cultural domains by Nida (1945) and Aubert (1981), and
also on the investigations on normalization by Baker (1996) and Scott (1998). The methodology
adopted in the present research required the use of WordSmith Tools software, which provided
the necessary resources for the collection of data from the novels and for the observation and
analysis of the cultural and textual aspects. Considering Gregory Rabassa’s and Barbara Shelby
Merello’s linguistic behavior, the results obtained from our parallel corpora showed that the
translators used different resources for translating cultural aspects as well as textual segments in
the four analysed novels: 1. reelaboration of the message; 2. use of loans from the source
language into the target language; 3. use of explicitations; 4. use of adaptations; 5. use of literal
translations; 6. use of omissions, among others and, sometimes, the simultaneous use of
different translation resources. As examples of loans used in the translated texts, we can
mention some words such as acarajés, berimbaus, caipirinhas, pai-de-santo, tapioca, xaréu.
The results also pointed to the use of different solutions for the same word in the translated
texts, a feature which allows the reader of the target language to understand the different aspects
that constitute a certain cultural marker, considering the extralinguistic features to which it
refers in the source universe such as, for example, “caboclo”: “backwoods”, “caboclo”,
“caboclo backwoodsman” and “half-breed”. Thus, we observed the difficulties imposed by
cultural barriers in the translation of cultural markers of the source language and culture, as well
as observing solutions, used in a conscious or unconscious way, by the translators, when dealing
with cultural frontiers between the source and target universes. The use of the resources
provided by corpus linguistics contributed to translation theory and practice, providing an
awareness of the role played by translators and the resources used by them, as well as the
tendencies presented when faced with the translation of original works with regionalist features.
KEYWORDS: Corpus-based translation studies. Literary translation. Cultural markers.
Normalisation.
INTRODUÇÃO
As inovações tecnológicas que presenciamos em nossos dias e que dizem
respeito a diversas áreas de nosso conhecimento têm-nos proporcionado crescentes
contatos com diferentes povos, línguas e, conseqüentemente, culturas. Tais contatos
podem ocorrer de modos variados, visando proporcionar interação entre as culturas
envolvidas. A tradução, por sua vez, configura-se como uma dessas possibilidades,
permitindo-nos o acesso a inúmeros “produtos” de origem estrangeira como, por
exemplo, as obras literárias, que retratam peculiaridades do universo cultural no qual
estão inseridas. Nesse sentido, a tradução de obras literárias constitui importante ponto
de contato entre culturas, tornando possível a apreensão, em larga escala, do conteúdo
das obras concebidas no interior de um sistema cultural por parte do público estrangeiro,
componente de sistema cultural diverso.
A problemática que envolve a tradução não diz respeito somente a questões de
ordem sintática ou lingüística, mas, por ser um produto do meio cultural em que foi
originada, reflete dificuldades de ordem extralingüísticas e culturais, muito mais
complexas de serem solucionadas pelo tradutor. Segundo Faria,
O tradutor, ele próprio, também é um intérprete crítico dos
conteúdos culturais, onde podem ser encontrados fatores
extralingüísticos, pois a língua é apenas um dos elementos
utilizados na criação literária. Questões como gênero, tema, época,
às vezes mais relevantes, podem influir no processo tradutório.
(FARIA, 1996, p. 124)
Entendido aqui como um mediador cultural, o tradutor torna-se, com seu
trabalho, responsável pela divulgação em língua e cultura estrangeiras não somente de
uma obra literária, mas de todo o repertório cultural e ideológico no qual a obra original
está imersa. Corroborando esse pensamento, Zimber enfatiza que “a tradução exige que
o tradutor seja, portanto, também um intérprete e, mais do que isso, um mediador
cultural” (ZIMBER, 2004, p. 23).
A presente pesquisa tem por objetivo observar o comportamento lingüístico de
dois tradutores profissionais ao lidar com dificuldades oriundas da tradução de quatro
obras literárias brasileiras, que apresentam como característica marcante o cunho
regionalista. Para tanto, apresentaremos os resultados da pesquisa realizada a partir dos
textos originais (TOs) em português Mar Morto (1936) e O Sumiço da Santa (1988), de
Jorge Amado, e dos respectivos textos traduzidos (TTs) para o inglês, Sea of Death
(1984) e The War of the Saints (1993), por Gregory Rabassa, bem como pelos TOs
Tenda dos Milagres (1969) e Tieta do Agreste (1977), do mesmo autor, e dos
respectivos TTs para o inglês, Tent of Miracles (1971) e Tieta (The Americas) (1979),
por Barbara Shelby Merello.
Segundo Aubert (1984), a tradução de determinada mensagem de uma língua
para outra é uma tarefa difícil, visto que envolve complexos socioculturais diferentes. A
transformação cultural implica a presença de maiores obstáculos na tradução, pois
envolve problemas não somente referentes a estruturas da língua de partida (LP) e da
língua de chegada (LC), mas também tomadas de decisão do tradutor com relação a
fatores psicológicos e socioculturais.
Zimber também destaca o papel do tradutor como mediador entre culturas, e a
importância de sua competência tradutória, e reflete, ainda, a dificuldade presente na
transformação de aspectos culturais intrínsecos, ao afirmar:
A tradução é vista como uma mediação cultural, um ato criativo e de
comunicação, e não somente como um ato lingüístico, onde significados
estáveis são transportados de uma língua para outra. No caso da obra, objeto de
nosso trabalho, trata-se de um texto profundamente marcado culturalmente,
exigindo a interpretação do tradutor, sua intervenção, decisões de sua parte.
Porém, nem sempre o tradutor consegue superar esses obstáculos. Vermeer, por
exemplo, considera que o tradutor é fator decisivo na tradução. A tradução é
uma transferência cultural, o que exige do tradutor o conhecimento de ambas as
culturas. O tradutor deve ter noção do valor de um acontecimento (histórico) no
texto original e seu valor relativo dentro do novo texto. (ZIMBER, 2004, p. 21)
Para Aubert, traduzir obras de cunho regionalista implica consideráveis
dificuldades ao tradutor, já que, por vezes, a compreensão do original por falantes
nativos já se torna complexa, visto que esses leitores podem estar subordinados a
diferentes subáreas geográficas, o que dificultaria o processo de apreensão da obra:
[...] a existência de traduções de obras literárias de cunho regionalista, por
vezes tão estreitamente vinculadas a determinadas realidades que até mesmo
falantes da mesma língua, mas pertencentes a outras sub-áreas culturais, sociais
e/ou geográficas, enfrentam sérias dificuldades para bem apreenderem o
conteúdo do texto em toda a sua plenitude. (AUBERT, 1981, p. 03)
Considerando os obstáculos provenientes da tradução cultural, mostram-se
pertinentes estudos de traduções de natureza descritiva, principalmente no que diz
respeito à tradução de obras portadoras de vocábulos que retratam realidades
extralingüísticas de cunho regionalista da língua e cultura de partida. É o caso das
quatro obras da literatura brasileira selecionadas para nossa análise, Mar Morto (1936) e
O Sumiço da Santa (1988), escritas por Jorge Amado e traduzidas por Gregory Rabassa,
bem como Tenda dos Milagres (1969) e Tieta do Agreste (1977), escritas pelo mesmo
autor e traduzidas por Barbara Shelby Merello. Tais obras foram escolhidas pela ampla
quantidade e vasta riqueza de marcadores culturais (MCs), bem como pela diversidade
de tais marcadores, por pertencerem a domínios culturais variados, visto que constituí
nosso interesse verificar a maneira como os MCs que se referem à culinária, às etnias,
aos hábitos, à ideologia e à religiosidade, e aos espaços geográficos característicos de
um povo foram traduzidos para a cultura de chegada.
Vale ressaltar outros aspectos decisivos para a escolha dos textos: a) cada par de
obras foi traduzido pelo mesmo tradutor profissional: Gregory Rabassa, em relação às
obras Mar Morto (1936) e O Sumiço da Santa (1988); e Barbara Shelby Merello, em
relação às obras Tenda dos Milagres (1969) e Tieta do Agreste (1977); b) foram escritas
pelo mesmo autor, Jorge Amado, apresentando, desse modo, características similares e
por vezes idênticas, como no caso de alguns MCs que ocorrem de forma análoga nos
quatro TOs, o que favorece nosso estudo comparativo intra-tradutor e inter-tradutores;
c) o período de nove anos de publicação entre as traduções de língua inglesa Sea of
Death (1984) e The War of the Saints (1993), realizadas por Gregory Rabassa; bem
como o período de oito anos de publicação entre as traduções de língua inglesa Tent of
Miracles (1971) e Tieta (The Americas) (1979), realizadas por Barbara Shelby Merello,
que nos permite observar e comparar o comportamento lingüístico de ambos os
tradutores de maneira diacrônica.
Desse modo, buscamos examinar em nossa pesquisa os produtos finais da
tradução de quatro obras literárias brasileiras de cunho regionalista, que retratam, por
meio dos MCs que apresentam, particularidades da cultura nordestina e baiana, com o
objetivo de analisar as escolhas dos tradutores ao lidar com as dificuldades oriundas da
tradução de MCs que representam realidades tão intrínsecas do universo de partida, bem
como identificar e analisar possíveis traços de normalização. Assim, para melhor
compreendermos a problemática que envolve a tradução cultural, procuramos, com esta
análise comparativa realizada pelo cotejamento dos TOs e dos TTs, observar opções
lingüístico-semânticas utilizadas pelos tradutores ao lidar com as obras amadeanas
selecionadas para a pesquisa.
Partindo da observação dos aspectos anteriormente mencionados, colocamos,
como perguntas de pesquisa: (A) quais MCs apresentam chavicidade positiva
1
nos
quatro textos de partida (TPs); (B) como os tradutores profissionais traduziram esses
MCs nos quatro textos de chegada (TCs); (C) como tais MCs distribuem-se por
domínios culturais; e (D) se e de que forma Gregory Rabassa e Barbara Shelby Merello
utilizaram recursos lingüístico-tradutórios nos TCs que podem ser identificados como
traços de normalização.
Quanto aos objetivos da pesquisa, subdividem-se em gerais e específicos. Os
objetivos gerais são:
x Observar o grau de similaridade e diferença na tradução de MCs de chavicidade
positiva na obra Mar Morto e sua tradução Sea of Death, bem como na obra O
Sumiço da Santa e sua tradução The War of the Saints.
x Observar o grau de similaridade e diferença na tradução de MCs de chavicidade
positiva na obra Tenda dos Milagres e sua tradução Tent of Miracles, bem como na
obra Tieta do Agreste e sua tradução Tieta (The Americas).
x Analisar comparativamente as soluções adotadas pelo tradutor Gregory Rabassa nas
traduções Sea of Death e The War of the Saints, em relação às soluções adotadas por
Barbara Shelby Merello, nas traduções Tent of Miracles e Tieta (The Americas),
para verificar a variação vocabular de ambos (comparação inter-tradutores).
x Observar quais as tendências apresentadas pelos dois tradutores diante dos textos
literários de cunho regionalista, escritos pelo mesmo autor.
x Observar traços de normalização presentes nos quatro TTs, em relação aos
respectivos TOs.
1
Segundo Berber Sardinha (2004), palavras-chave positivas “são aquelas cujas freqüências são
estatisticamente superiores no corpus de estudo em relação ao de referência.” (BERBER SARDINHA,
2004, p. 111).
Os objetivos específicos são:
x Identificar MCs com chavicidade positiva nas quatro obras analisadas, em relação às
respectivas traduções.
x Elaborar um glossário de MCs presentes em cada par de obras analisadas.
x Observar a variação vocabular do tradutor Gregory Rabassa em Sea of Death e The
War of the Saints (comparação intra-tradutor).
x Observar a variação vocabular da tradutora Barbara Shelby Merello em Tent of
Miracles e Tieta (The Americas) (comparação intra-tradutor).
x Analisar a tradução de MCs em relação às quatro obras traduzidas, a fim de
determinar se e de que forma o significado cultural na LP foi traduzido no decorrer
dos TTs. (comparação inter-tradutores).
x Levantar e analisar traços de normalização deixados por Gregory Rabassa nas
traduções Sea of Death e The War of The Saints, em relação às respectivas obras
originais Mar Morto e Sumiço da Santa.
x Levantar e analisar traços de normalização deixados por Barbara Shelby Merello nas
traduções Tent of Miracles e Tieta (The Americas), em relação às respectivas obras
originais Tenda dos Milagres e Tieta do Agreste.
Com a intenção de alcançar os objetivos acima, recorremos, como
fundamentação teórica, à proposta de Camargo para o projeto de pesquisa “Padrões de
Estilo de Tradutores — PETra: Investigação em corpora de traduções literárias,
especializadas e juramentadas” (2005, 2007), ao qual este trabalho está vinculado.
Camargo sugere uma abordagem interdisciplinar entre a proposta para pesquisas em
tradução baseadas em corpus de Baker (1993, 1995, 1996, 2000), os estudos de
lingüística de corpus de Berber Sardinha (1999, 2000, 2003, 2004) e os estudos sobre
normalização de Scott (1998).
Utilizamos o programa WordSmith Tools, criado por Mike Scott, que nos
proporcionou os recursos necessários para atingir os objetivos propostos no que diz
respeito ao levantamento de dados ao longo das obras, para o observação dos MCs, bem
como dos aspectos referentes à normalização.
Nossas análises, ao estarem baseadas em dados obtidos eletronicamente a partir
dos corpora de nossa pesquisa, justificam-se em virtude de possibilitarem ao
pesquisador proceder, de forma mais ampla e abrangente, a um estudo de natureza
descritiva e comparativa em extensões consideravelmente maiores do que apenas por
seleção de amostras dos corpora. A varredura de vocábulos recorrentes ao longo das
oito obras, quatro originais e quatro traduções, tornou-se possível, em nossa pesquisa,
graças à abordagem proporcionada pelos estudos de tradução baseados em corpora e
pela lingüística de corpus. A observação dos dados obtidos de maneira eletrônica
proporcionou-nos maior conscientização acerca do papel desempenhado pelo tradutor,
das estratégias por ele empregadas, e das tendências apresentadas diante da tradução das
obras originais de cunho regionalista.
Quanto à análise dos dados obtidos para observarmos individualmente as opções
de tradução adotadas, tornou-se também necessário recorrer a uma descrição específica
para cada um dos marcadores selecionados.
Desse modo, dada a natureza de nossa pesquisa, mostrou-se importante, além da
varredura, na totalidade das obras, e da identificação de traços de normalização, por
meio da proposta de Baker (1996) e de Scott (1998), também procedermos a uma
complementação por meio de uma análise detalhada e específica dos MCs, com base na
proposta de Vinay & Darlbernet (1958) reformulada por Aubert (1984, 1998) para as
modalidades tradutórias e na proposta de
Nida (1945) para os domínios culturais,
também reformulada por Aubert (1981).
A presente tese encontra-se dividida em cinco seções e é complementada por
seis Apêndices:
Na Introdução, apresentamos a justificativa a respeito da escolha das obras que
compõem os corpora de nossa pesquisa, as perguntas de pesquisa, e os objetivos que
pretendemos alcançar em nossa investigação. Também se encontram aqui elencadas as
seções que compõem a presente tese.
Na Seção I, Jorge Amado: Obra e Dados Bibliográficos, abordamos aspectos da
vida do autor e da sua obra, e apresentamos uma síntese dos quatro romances
analisados.
Na Seção II, Aspectos Culturais da Tradução, tratamos de aspectos pertinentes à
tradução cultural, ao papel do tradutor como mediador entre culturas, bem como à
tradução literária.
Na Seção III, Fundamentação Teórica, mostrou-se pertinente apresentar,
inicialmente, a conceituação de MCs, bem como de corpus e corpus paralelo. Após a
formulação dos conceitos básicos de nossa investigação, passa a ser pertinente tratar das
vertentes teóricas que levaram aos estudos de tradução baseados em corpus; fazemos
também uma descrição do emprego dos diversos corpora nos estudos de tradução bem
como das ferramentas utilizadas para tratamento de tais corpora. Depois, abordamos os
traços de tradução estudados por Baker, como os traços de normalização, e procedemos
à conceituação dos domínios culturais e das modalidades tradutórias utilizadas em nossa
pesquisa.
Na Seção IV, Material e Método, elencamos o material utilizado para a
compilação dos corpora e apresentamos os passos metodológicos e a forma e análise
dos resultados adotados para a execução de nossa pesquisa.
A Seção V, Análise de Resultados, subdivide-se em cinco subitens. A fim de
observar o comportamento intra-tradutores, apresentamos, no primeiro subitem, as
opções de tradução de seis MCs selecionados que ocorrem isoladamente, em cada obra
original; as opções de tradução de associações dos referidos MCs com seus colocados
nas quatro obras analisadas, bem como as análises das respectivas opções tradutórias
para tais MCs isolados e em ocorrência com seus colocados. No segundo subitem,
tratamos do comportamento lingüístico inter-tradutores quanto à tradução de MCs e
seus colocados, observando as opções utilizadas por cada um dos tradutores analisados.
No terceiro subitem, procedemos à análise dos marcadores por domínios culturais nos
TOs, a fim de verificar como ocorreu sua distribuição ao longo das quatro obras. No
quarto subitem, expomos as análises dos aspectos referentes aos traços de normalização,
observados nas quatro obras traduzidas, os quais nos permitiram verificar tendências no
comportamento tradutório de Gregory Rabassa, bem como de Barbara Shelby Merello.
No que tange às Considerações Finais, apresentamos as reflexões decorrentes das
investigações empreendidas nas seções anteriores, e tecemos considerações acerca dos
resultados obtidos.
Posteriormente, encontram-se elencadas as Referências Bibliográficas e
Bibliografia Consultada, seguidas de seis apêndices. No Apêndice 1, apresentamos uma
amostra da lista de palavras-chave, por ordem de freqüência, da obra Mar Morto; no
Apêndice 2, apresentamos uma amostra da lista de palavras-chave, por ordem de
freqüência, da obra O Sumiço da Santa; o Apêndice 3 contém um glossário de MCs da
obra Mar Morto, com as opções de tradução para cada MC e seus respectivos contextos
de ocorrência, bem como sua classificação por domínios culturais; analogamente, o
Apêndice 4, contém um glossário de MCs da obra O Sumiço da Santa, com as opções de
tradução para cada MC e seus respectivos contextos de ocorrência, bem como sua
classificação por domínios culturais; o Apêndice 5 contém um glossário de MCs da obra
Tenda dos Milagres, com as opções de tradução para cada MC e seus respectivos
contextos de ocorrência, bem como sua classificação por domínios culturais; e o
Apêndice 6 contém um glossário de MCs da obra Tieta do Agreste, com as opções de
tradução para cada MC e seus respectivos contextos de ocorrência, bem como sua
classificação por domínios culturais.
1. JORGE AMADO: OBRA E DADOS BIBLIOGRÁFICOS
Traduzir Jorge Amado, considerado um dos escritores que mais difundiram a
cultura brasileira internacionalmente por meio da literatura e também do cinema é, sem
dúvida, tarefa árdua e de grande responsabilidade, até mesmo para o tradutor mais
experiente.
Segundo Corrêa (1998, p. 27), Jorge Amado é “considerado no exterior um
‘tradutor da essência e da cor da Bahia, um profundo conhecedor da alma brasileira’
2
e
sua obra um retrato da cultura brasileira”. Amado foi um dos autores que mais retratou a
Bahia, a terra do cacau, com as mulheres típicas, a cultura de um povo rico em
personagens e sua terra. Criou também um público assíduo no cenário internacional,
tendo incrementado o interesse por literatura brasileira contemporânea.
É um dos nossos romancistas mais lidos. Vendeu, no Brasil, aproximadamente
20 milhões de exemplares de seus livros. Suas obras foram traduzidas em 55 países para
39 idiomas; 17 delas foram traduzidas para o inglês e publicadas nos Estados Unidos e
nove delas também foram publicadas na Inglaterra, tornando-o não somente o
romancista brasileiro com o maior número de obras traduzidas, mas também o escritor
mais traduzido no mundo, segundo registros do Guinness Book of World Records de
1996; além disso, teve nove de suas obras adaptadas para o cinema e com intensa
divulgação no exterior. Amado também teve alguns de seus livros adaptados para o
teatro, para o rádio, bem como para histórias em quadrinhos em vários países além do
Brasil, como Alemanha, Argentina, Estados Unidos, França, Itália, Polônia, Portugal,
Suécia e Tchecoslováquia.
2
http://www.skylight.com.br/tieta apud Corrêa (1998, p. 27).
Jorge Amado recebeu homenagens em várias partes do mundo, como do irmão,
também escritor, James Amado, do político Luís Carlos Prestes, do arquiteto Oscar
Niemeyer, do dirigente cubano Fidel Castro, do filósofo Jean-Paul Sartre, do escritor
chileno Pablo Neruda, da escritora francesa Simone de Beauvoir, além de ter sido
condecorado pelo presidente francês François Mitterrand. O escritor recebeu, também,
inúmeros prêmios e títulos honoríficos, entre os quais: Prêmio Nacional de Romance do
Instituto Nacional do Livro (1959); Prêmio Graça Aranha (1959); Prêmio Paula Brito
(1959); Prêmio Jabuti (1959 e 1970); Prêmio Luísa Cláudio de Sousa, do Pen Club do
Brasil (1959); Prêmio Carmen Dolores Barbosa (1959); Troféu Intelectual do Ano
(1970); Commandeur de lOrdre des Arts et des Lettres, da França (1979); Prêmio
Fernando Chinaglia, Rio de Janeiro (1982); Prêmio Nestlé de Literatura, São Paulo
(1982); Prêmio Brasília de Literatura — Conjunto de Obras (1982); Prêmio Moinho
Santista de Literatura (1984); prêmio BNB de Literatura (1985); Doutor Honoris Causa
pela Universidade Federal da Bahia (1980) e do Ceará (1981); Doutor Honoris Causa
pela Universidade Degli Studi de Bari, Itália (1980) e pela Universidade de Lumière
Lyon II, França (1987); e Comendador da Ordem do Congresso Nacional, Brasília
(1986).
João Ubaldo Ribeiro, famoso e renomado escritor brasileiro, ao falar sobre a
importância de Amado no contexto literário, demonstra sua admiração pelo autor, ao
afirmar:
Jorge Amado é uma das figuras mais importantes de nossa história e a sua obra
marcou indelevelmente o século que se foi. Ainda passarão gerações, antes que
se possa adquirir a perspectiva adequada para a apreciação de Jorge na vida
cultural brasileira, mas, já em nosso tempo, não há como escapar do
reconhecimento de que ele é o fecundo e original criador e catalisador de um
universo que hoje freqüenta o imaginário de milhões de brasileiros — e
continuará a freqüentar, como acontece com os grandes mestres em toda a
parte.
3
(UBALDO RIBEIRO, s/d)
E João Ubaldo Ri
beiro prossegue, mencionando características peculiares de
Jorge Amado, que evidenciam sua condição de escritor de romances:
Não há ninguém que se compare a ele no amor, transmutado em fábula, fantasia
e poesia, pelo nosso povo, que sempre foi o seu personagem principal,
especialmente o povo da Bahia, onde, afinal, se abriga parte tão significativa da
identidade nacional. Sempre se orgulhou em apresentar-se como romancista,
nunca aspirou a ser mais do que, em suas próprias palavras, um contador de
histórias. E um contador de histórias ele o foi, a vida inteira, um construtor de
mundos, um tecelão de mitos, o escritor que ensinou tantos a ler, amar e
compreender o nosso país. E poucos haverá como ele, brasileiro universalmente
conhecido e aclamado, que tenham contribuído tanto para a nossa afirmação,
ameaçada de todas as formas, mas ainda brava e persistente, graças a homens
de sua estirpe. (UBALDO RIBEIRO s/d)
A importância de Jorge Amado também foi recentemente destacada na revista
Pesquisa FAPESP Online, ao mencionar:
Quando José Saramago venceu o Nobel de Literatura, em 1998, afirmou numa
entrevista que quem deveria estar ganhando aquele prêmio, em verdade, deveria
ser o brasileiro Jorge Amado (1912-2001). Mas depois de décadas nas estantes
de muitos brasileiros, o escritor baiano foi relegado ao descaso, visto com
pouco caso pelos acadêmicos e esquecido do público, apesar de ele ser um
grande formador de opinião, um homem público cujas idéias tiveram grande
penetração em várias camadas da população e em várias regiões do Brasil e do
mundo. (Pesquisa FAPESP Online, maio de 2008)
Com o objetivo de ressaltar sua contribuição no cenário literário nacional, a
Companhia das Letras deu início, em março de 2008, ao projeto de reedição das obras
de Jorge Amado, que prosseguirá até o ano de 2011, em que 33 volumes serão
3
O texto pode ser consultado na íntegra no site http://br.geocities.com/prosador_do_brasil/ (s/d, acesso
em 27 maio 2008.
(re)lançados, entre eles o inédito Hora da Guerra, que reúne artigos do escritor
concebidos na década de 1940 a respeito da Segunda Guerra Mundial, para um jornal
baiano. Participam também do projeto grandes nomes no cenário da literatura brasileira
e mundial, como Saramago, Milton Hatoum, Mia Couto, Nelson Pereira dos Santos,
Affonso Romano de Sant’Anna, Lygia Fagundes Telles, Moacyr Scliar, Reginaldo
Prandi, José Paulo Paes e Ana Miranda. No que se refere às obras analisadas em nossa
pesquisa, com exceção de Mar Morto, sem previsão de reedição, os lançamentos
previstos pela referida editora datam: Tenda dos Milagres (agosto de 2008); Tieta do
Agreste (fevereiro de 2009) e O Sumiço da Santa (agosto de 2010).
Desse modo, justifica-se o estudo dos romances de Jorge Amado, tendo em vista
a atualidade de suas obras no cenário contemporâneo, bem como o reconhecimento de
seu trabalho em âmbito nacional e mundial.
1.1. A VIDA DE JORGE AMADO
Jorge Amado nasceu em Ferradas, em 10 de agosto de 1912, hoje município de
Itabuna (Bahia), cidade da região cacaueira no sul do Estado da Bahia. Colecionava
muitas histórias e, segundo Perez (1970),
Uma das mais longínquas recordações que o escritor tem da infância (aos dois
anos) prende-se justamente à figura do pai. Estava o velho na varanda da casa,
cortando cana, quando atiraram nele (por motivo de política local). Foi ferido,
mas assim mesmo ainda levou o filho até a cozinha, caindo aí. Lembra-se
também o romancista da enchente do rio Cachoeira, em 1914, que levou tudo
— inutilizou a roça e destruiu a pequena propriedade. (PEREZ, 1970, p.197)
Tais situações se tornariam comuns em romances como Terras do Sem Fim
(1943) ou Tocaia Grande (1984). A gravidade do incidente, que fez com que perdessem
tudo, levou a família a mudar-se para Ilhéus, que “vivia, nesta época, o apogeu de suas
lutas pela posse da terra” (PEREZ, 1970, p.197). Foi este ambiente instável em que
Amado passou sua infância que, posteriormente, viria a servir de tema e cenário para
algumas de suas obras. Aos onze anos, iniciou seus estudos no colégio Antônio Vieira,
dos Jesuítas, em Salvador.
Em 1930, Amado mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se formou em Ciências
Jurídicas e Sociais e começou realmente sua carreira literária. Em 1931 escreveu O País
do Carnaval, que surpreendeu a crítica e, devido ao grande sucesso de venda alcançado,
fez com que a obra ganhasse uma segunda edição, no ano seguinte.
Amado aderiu ao Partido Comunista Brasileiro no começo da década de 30.
Juntamente com a carreira de escritor, começava também a militância comunista, que o
levaria a ser preso durante o regime do Estado Novo e ter, inclusive, alguns de seus
livros apreendidos pela polícia.
Seu próximo romance publicado foi Cacau (1933), que se tornou um marco para
a época, visto que conseguiu esgotar os dois mil exemplares da primeira tiragem em
apenas 40 dias. Em 1934 publica Suor, no qual o ambiente é “a própria cidade de
Salvador, e seus personagens os operários do cais, os caixeiros, as prostitutas” (PEREZ,
1970, p.200). No ano seguinte, Amado publica Jubiabá, obtendo grande êxito e,
segundo Perez (1970), “em 1935, já era Jorge não só um escritor de grande público em
todo o Brasil, mas começava a projetar-se no estrangeiro” (PEREZ, 1970, p.201). Em
1936 ocorre a publicação de Mar Morto, em que sua qualidade de narrador fica mais
nítida ao público.
Em 1937, o escritor escreve e publica Capitães de Areia, e vivencia um período
agitado que marca o advento do Estado Novo: além de ser preso, seus livros são
proibidos no Brasil. Sua obra Terras do Sem Fim é publicada em 1943, e retrata as lutas
pelas terras na região cacaueira do sul da Bahia, que o escritor vivenciou ainda criança.
No ano seguinte publica São Jorge dos Ilhéus, repetindo o sucesso do romance anterior.
Em 1945, publicou o romance Bahia de Todos os Santos e também uma biografia do
líder comunista Luiz Carlos Prestes, intitulada “Cavaleiro da Esperança”, nome pelo
qual Prestes era conhecido. Em 1945, Amado foi eleito deputado federal pelo Partido
Comunista e assumiu sua cadeira no ano seguinte, criando leis que beneficiem a
atividade artística e cultural. Também em 1946 publica o romance Seara Vermelha e,
em 1947, a peça O Amor de Castro Alves. Todavia, em 1947, o Partido Comunista e
todos os demais partidos de esquerda no Brasil foram banidos pelo então presidente
Eurico Gaspar Dutra; por serem considerados partidos ilegais todos os seus
parlamentares foram cassados, o que fez com que Amado fosse embora para a França,
onde ficaria por cinco anos. Em 1950, Amado e sua família foram morar na
Checoslováquia. Em 1951 Amado recebe o Prêmio Stalin Internacional da Paz, pelo
conjunto de sua obra.
No tocante à divulgação de suas obras no cenário mundial, foi decisiva a atuação
do partido político, que ajudou a promover a venda, nos países do antigo bloco
comunista, de mais de 10 milhões de livros.
Em 1954, Amado publica Os Subterrâneos da Liberdade. Foi nessa época, ao
escrever o referido livro, que Amado passou a perceber que seus interesses literários não
encontravam apoio entre os colegas partidários. Com o receio de estar afastando-se da
arte, Jorge Amado decidiu abandonar a militância do Partido Comunista Brasileiro em
1956, pois queria voltar a escrever, sem dividir seu tempo com ideais políticos. No
entanto, o engajamento político preencheu um capítulo central na vida do autor: muitos
estudiosos defendem que essas datas (1930 e 1956) delimitam também a “primeira fase”
de sua literatura, uma fase em que Amado evoluiu dos romances de rebeldia e denúncia
para os “romances proletários”, cada vez mais imbuídos de ideologia.
Em 1956, Amado encontra-se novamente no Rio de Janeiro. A partir desse ano,
o autor deu uma guinada em sua carreira, trazendo para sua obra outro aspecto: o
humor. A crítica trata essa nova fase como mais “carnavalesca”, com a publicação em
1958 de Gabriela, Cravo e Canela, que ganhou versão em 33 idiomas, teve sua tiragem
de 20 mil exemplares esgotada em 15 dias, e recebeu cinco prêmios. Aquele que seria
um de seus maiores sucessos internacionais marcou então uma nova fase literária, em
que se destacavam os personagens bufões, o malandro, e características como o lirismo.
Em 1961, Amado publica Os Velhos Marinheiros e, no mesmo ano, é eleito
como Membro da Academia Brasileira de Letras, e seu nome passou a fazer parte, pela
primeira vez, de indicações para o Prêmio Nobel de Literatura. Embora não tenha sido
agraciado com tal premiação, o reconhecimento público rendeu-lhe diversas
homenagens, como ruas batizadas com seu nome.
Em 1964, o escritor publicou Os Pastores da Noite. Dois anos mais tarde seu
romance Dona Flor e Seus Dois Maridos também é publicado. Em 1969, é a vez de
Tenda dos Milagres.
Amado procurava isolar-se para poder escrever e, desse modo, algumas de suas
obras foram redigidas em refúgios, como Tenda dos Milagres, escrita num sítio na
Bahia; Tieta do Agreste, em Londres; Tocaia Grande, em Petrópolis; Navegação de
Cabotagem, escrita em Paris, onde possuía um apartamento.
Em 1979 Amado assistiu a criação do Partido dos Trabalhadores,
decepcionando-se mais tarde com o mesmo, e apoiou o movimento das “Diretas Já”, em
1984.
Em 1987 surgiu a Fundação Casa de Jorge Amado, sediada em Salvador,
abrigando o acervo bibliográfico do escritor, bem como objetos coletados pelo escritor
durante sua vida inteira. Nos últimos anos de vida, Amado recolheu-se à sua casa em
Salvador por causa de problemas cardíacos, motivo pelo qual passou a usar um
marcapasso desde 1996. Recebeu, em março de 1998, o título de doutor honoris causa
na Sorbonne, em Paris, uma das mais importantes universidades do mundo.
Amado possuía também um título honorífico em um dos terreiros de candomblé
mais tradicionais de Salvador, o Ilê Axé Opô Afonjá, em que era Obá Otun Arolu (em
que “obá” seria algo como “comendador” e “Otun Arolu”, o nome africano escolhido
pelo homenageado).
Jorge Amado morreu no dia 06 de agosto de 2001, aos 88 anos, vítima dos
problemas cardíacos.
1.2. A OBRA DE JORGE AMADO
Romances Publicados:
x País do Carnaval — 1931
x Cacau — 1933
x Suor — 1934
x Jubiabá — 1935
x Mar Morto — 1936
x Capitães de Areia — 1937
x ABC de Castro Alves — 1941
x O Cavaleiro da Esperança — 1942
x Terras do Sem Fim — 1943
x São Jorge dos Ilhéus — 1944
x Bahia de Todos os Santos — 1945
x Seara Vermelha — 1946
x O Amor do Soldado — 1947
x O Mundo da Paz — 1951
x Os Subterrâneos da Liberdade (Trilogia: Os Ásperos Tempos, A Agonia da Noite e
A Luz no Túnel) — 1954
x Gabriela, Cravo e Canela — 1958
x A Morte e a Morte de Quincas Berro Dágua — 1961
x Os Velhos Marinheiros ou O Capitão de Longo Curso — 1961
x Os Pastores da Noite — 1964
x Dona Flor e Seus Dois Maridos — 1966
x Tenda dos Milagres — 1969
x Tereza Batista Cansada de Guerra — 1972
x O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá — 1976
x Tieta do Agreste — 1977
x Farda, Fardão, Camisola de Dormir — 1979
x O Menino Grapiúna — 1981
x A Bola e o Goleiro — 1984
x Tocaia Grande: a Face Obscura — 1984
x O Sumiço da Santa — 1988
x Navegação de Cabotagem — 1992
x A Descoberta da América pelos Turcos — 1994
x O Compadre de Ogun (Edição própria) — 1995
x CD-ROM Jorge Amado: Vida e Obra — 1995
x O Milagre dos Pássaros — 1997
x A Bola e o Goleiro (Relançamento com novo projeto gráfico) — 2000
Contos:
x História do Carnaval — 1945
x De como o Mulato Porciúncula Descarregou o seu Defunto — 1963
x As Mortes e o Triunfo de Rosalinda — 1965
Poesia:
x A Estrada do Mar (livro de poemas em prosa, edição limitada) — 1937
x Álbum-roteiro
x Bahia Boa Terra Bahia (edição limitada)
Co-autorias:
x Lenita (com Dias da Costa e Edson Carneiro) — 1930
x